~ Hey! ~
"Mrs. Margot", criado e administrado por Tiago Cripton é de onde veio mais uma lista de tópicos dentre os quais devo encaixar leituras que desejo realizar no ano de 2018. Vocês já devem ter percebido que me embrenhei em vários Desafios Literários, 5 para ser mais exata e este post, refere-se ao 3º deles. Espero manter o ritmo durante os 12 meses e continuar disponibilizando as resenhas com assiduidade. Sem mais delongas, o lido da vez, foi:
"Garota, Interrompida", Susanna Kaysen
★★★★
1. Livro Publicado em ano anterior ao seu nascimento. Nasci em 1998, o livro é de 1993
A autora traz, sabiamente, em capítulos curtos e objetivos, relatos autobiográficos sobre o período em que esteve internada num hospício após ter sido diagnosticada com distúrbio de personalidade limítrofe, aos 18 anos.
Sabiamente, pois, esse detalhe é de suma importância para proporcionar uma leitura fluída, rápida, clara e até mais prazerosa mesmo sendo um conteúdo denso.
O livro é tanto auto bibliográfico, quanto crítico e auto crítico. Vale-se ressaltar a diferenciação entre os dois últimos termos, uma vez que o texto aborda uma visão analítica acerca da pessoa "Susanna" e todos os questionamentos sobre sua sanidade e também, de forma genérica, onde situa - se a linha tênue entre a lucidez e a descompensação.
Como a visão é da personagem principal e por sua vez em primeira pessoa, enveredamos no que ela quer que enveredemos. Seu arco temporal e evolutivo é perfeitamente traçado e nítido. No primeiro momento, tomamos ciência de como chegou ao ponto de internação e como não tem certeza de que de fato tem algum transtorno psíquico, transparece a dúvida e nos faz questionar também se não teria sido equívoco ou resultado de negligencia medica. Chegamos a conclusão de que independente, ela queria estar lá. Conformou-se.
Depois, conhecemos algumas das outras internas, as mais próximas em seu pavilhão. Cada qual com as peculiaridades de seus quadros clínicos. Em comum, a perturbação com o mundo exterior e ao mesmo tempo a vontade de experimentá-lo, seguido de aversão aquele hospício que as aprisionava, mas também abrigava-as. Essas outras personagens são excelentes para termos noção da diversidade de casos e vidas que ali se encontram, as motivações e diferentes formas de como chegar a um mesmo ponto: insanidade.
Até em relação ao dia a dia delas, inicia-se com certo distanciamento com as cuidadoras, tanto que nas primeiras páginas são mencionadas apenas como "enfermeiras", depois foram identificadas pelo nome, demonstrando que o elo passou a ser construído, seja para positiva, seja para negativamente. No mais, explica os "regimes" de tratamento da organização na Instituição, a disposição dos cômodos, as rondas e o nível de autonomia pode ser conferida as pacientes.
Em seguida, aprofunda-se em termos técnicos, e a perspectiva muda. As colocações não estão mais como relatos de um tempo remoto, como quando conta dos dias internada, dando impressão de pretérito. Passa a conversar diretamente com o leitor, expressando suas opiniões acerca do que seria loucura, as etapas, detalha sua experiência, mostra as características do seu diagnóstico, aponta os pontos que se assemelham e os que não. Concluí-se que os traços poderiam ser facilmente comparados com os exibidos por qualquer adolescente convencional. Daí a critica aos diagnósticos de doenças mentais na década de 60, que aparentemente eram arbitrários. Nessa parte, é o ápice da personagem, pois demonstra uma maturidade espantosa. A maturidade de quem viu, viveu e hoje está perfeitamente apta para ter uma visão coerente e distanciada de tudo. O arco se completa lindamente.
Como referências para os argumentos, tem-se Freud, que num livro com esse teor, não poderia faltar e para minha feliz surpresa, Platão e o "Mito da Caverna", que nada mais é do que uma reflexão sobre a veracidade do que vemos e do que entendemos do mundo. O que distinguia-as dos demais, o que fazia-as loucas e os restantes não.
O capítulo mais real e ao mesmo tempo triste, ao meu ver, foi o qual traçou o estigma que "pessoas insanas" carregam. Quando diagnosticadas, o medo, o receio em confraternizar com elas, de no fim das contas entender e compartilhar das mesmas neuroses. Quando reabilitadas e tidas como "recuperadas", a dificuldade em reenserir-se na sociedade depois de anos, como adquirir confiança em si mesmas e conquistar a de outros. Como ter uma vida social, profissional e amorosa normal depois que lhes arrancaram toda a normalidade? Estão marcadas para sempre. É uma verdade e doi.
"Garota, Interrompida" é fascinante. Nos detalhes, da coesão do título, ao desenrolar do texto.